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segunda-feira 26 de outubro de 2020 às 18:23h

Petrobras pede para ser tratada pelo STF como uma embaixada

JUSTIÇA, NOTÍCIAS


Para não compartilhar a íntegra de três acordos bilionários fechados com autoridades dos Estados Unidos, a Petrobras solicitou que o ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, trate a empresa como uma embaixada.

A manifestação foi enviada ao STF em 16 de outubro, nos autos do processo em que o ex-presidente Lula requer acesso aos acordos por considerá-los essenciais para sua defesa no caso do tríplex do Guarujá e do suposto recebimento de propina da Odebrecht.

Na peça, a Petrobras recorre a um precedente de 2ª Turma do STF. Sob relatoria do ministro aposentado Celso de Mello, o colegiado decidiu, em 2010, que a Corte não tem poder para impor o cumprimento de determinações judiciais às delegações diplomáticas estrangeiras sediadas no Brasil (HC 102.041).

Conforme o ConJur, a empresa reconhece que a decisão citada diz respeito a processo envolvendo uma embaixada. Diz, no entanto, que “obrigar a Petrobras a apresentar documentos integrantes de procedimentos administrativos estrangeiros e que contém informações de titularidade do Estado estrangeiro (EUA), implicaria, por via oblíqua, violar justamente o entendimento firmado no HC 102.041, tencionando o conflito entre soberanias que esse STF quis evitar no referido precedente”.

Ainda de acordo com a manifestação, “a publicação desses documentos confidenciais pode prejudicar as referidas autoridades estrangeiras na sua capacidade de solucionar casos via acordos, uma vez que as partes interessadas serão desestimuladas a prosseguir nas tratativas, em razão da possibilidade da perda do sigilo em outros ordenamentos”.

Com base nesse argumento, a Petrobras diz que qualquer pedido de compartilhamento deve ser enviado ao Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), órgão brasileiro vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, que trata da cooperação com outros países em matéria penal.

Ocorre que a Petrobras é uma sociedade de economia mista que detém domínio sobre o acervo solicitado pela defesa de Lula. Desta forma, os acordos com os EUA foram fechados diretamente entre a empresa e autoridades norte-americanas, sem ter relação com o DRCI.

Em manifestação ajuizada na última sexta-feira (23/10), a defesa de Lula diz que a Petrobras prestou informações incorretas e pede que a petrolífera seja condenada por litigância de má-fé. A peça é assinada pelos advogados Cristiano ZaninValeska MartinsMaria de Lourdes Lopes e Eliakin T. Y. Pires dos Santos.

“Embora a Petrobras já tenha, neste autos, tentado até mesmo se equiparar a uma embaixada para placitar a sonegação de documentos e informações, a petrolífera é uma sociedade de economia mista. A despeito do que pretende induzir, não se está cobrando neste palco, evidentemente, documentos e informações do DoJ [Departamento de Justiça dos EUA], da SEC [Securities and Exchange Commission] ou de qualquer outro órgão norte-americano, mas, sim, documentos e informações em domínio e disposição da Petrobras, empresa brasileira que, voluntariamente, se habituou como assistente de acusação da ‘lava jato'”, dizem os advogados.

A defesa também diz que “a presente contenda não está a tratar — nem de longe! — de assistência mútua entre estados no processo penal, mas obviamente de elementos de prova em pleno domínio e disposição da acusação que estão sendo solapadas do conhecimento da defesa”.

Inconsistência

Além da tentativa de se equiparar a uma embaixada, a peça da Petrobras contém uma série de inconsistências, de acordo com os advogados de Lula. A empresa diz, por exemplo, que o os acordos não seriam pertinentes à defesa, já que não citam o ex-presidente.

Esse é, no entanto, justamente o argumento usado pela defesa do petista para pedir acesso aos acordos: mostrar que a Petrobras adotou uma tese nos Estados Unidos e outra no Brasil. Aqui, a empresa se portou como vítima, apontando a suposta participação de Lula em esquema de corrupção. No outro país, se declarou culpada, atribuindo a outros atores crimes que aqui são atribuídos a Lula.

Nos acordos, ao contrário do que diz agora, a Petrobras indicou, ainda que de forma implícita, um rol de supostos envolvidos nos atos de corrupção. A petrolífera narra a participação de ao menos quatro executivos em um esquema de recebimento de vantagens indevidas de empresários. É citado também um ex-governador de Pernambuco e um de seus assessores.

“Logo se vê que os fatos versados perante a jurisdição norte-americana, além de estarem diretamente relacionados aos autos de origem, estão, sim, umbilicalmente ligados à existência de corrupção na Petrobras, e não de simples irregularidades contábeis. Tanto é que a petrolífera listou as condutas criminosas e seus respectivos responsáveis, sem qualquer referência — ao revés do sustentado nos autos de origem — ao ex-presidente Lula”, dizem os advogados.

Os acordos

Ao todo, a Petrobras fechou três acordos com as autoridades norte-americanas: um com o Departamento de Justiça, que envolvia uma investigação criminal; outro com a SEC, que é de natureza cível; e, por fim, um acordo com investidores.

No caso do DoJ, a empresa brasileira fechou acordo de R$ 3,5 bilhões. Do total, R$ 2,5 bi foram depositados em uma conta da 13ª Vara Federal de Curitiba. O valor seria destinado a programas de “combate à corrupção” que ficariam sob a tutela do Ministério Público Federal.

A Petrobras diz que a conclusão dos procedimentos perante a SEC e o DoJ ocorreu quando as ações contra Lula já tramitavam no Superior Tribunal de Justiça. Assim, afirma a empresa, os acordos não foram usados pelo MPF na acusação contra Lula.

No entanto, conforme revelado pela ConJur em 2018, as autoridades brasileiras e norte-americanas já mantinham uma relação de proximidade havia alguns anos. Além disso, um Comitê Especial para ser interlocutor das investigações internas da empresa foi criado em 2014, três anos antes do ex-presidente ser condenado por Sergio Moro no caso do tríplex. À época, a Petrobras assumiu voluntariamente a posição de assistente de acusação no processo contra Lula.

“Ao passo que essas informações são deliberadamente sonegadas da defesa, a força-tarefa sempre teve amplo acesso ao material. Neste sentido, desde pelo menos o início de 2015 havia comunicações entre o DoJ e o então coordenador da autodenominada ‘força-tarefa da lava jato’ em Curitiba, o procurador da República Deltan Dallagnol”, dizem os advogados de Lula.

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